Naquele dia, mergulhada nos meus pensamentos, ia para a escola a pé, quando um Senhor interrompe abruptamente o meu mundo e faz-me entrar no dele.
Este Senhor queria saber as direcções para um local que era ali perto, mas mesmo depois de eu lhe dar essas direcções ele não se foi embora e começou a falar. A falar sobre todo o tipo de coisas, sobre a vida, sobre a família, sobre as pessoas... Ás vezes era difícil perceber o que dizia porque falava muito baixinho e eu sempre fui um bocado surda, mas juntado as partes da conversa que percebi: O Senhor vinha de Goa e trabalhava em Portugal. Não sei bem onde, isso já não consegui perceber.
No meio de tanta conversa, ele falara de como as pessoas de hoje em dia eram oportunistas e de como faltava humanidade e bondade em muitas delas. Ele falou-me do dinheiro que não valia nada e da amizade que era uma das coisas mais importantes na vida.
Este Senhor transbordava simplicidade e transparência. E sabedoria, muita sabedoria, uma sabedoria escondida de quem já viveu muito e passou por muito. Uma sabedoria que não vale grande coisa para a sociedade de hoje, mas que torna a pessoa, absolutamente, mais rica interiormente. Ele ainda me disse que o ser humano estava-se a perder e que fazia coisas absolutamente abomináveis.
O Senhor falou e falou e continuo a falar como se não tivesse tido ninguém para falar nos últimos anos e precisa-se de partilhar tudo o que estava "lá" dentro.
Disse-me também que não havia pessoas iguais no mundo, e a isso eu respondi: - Pois não, só parecidas. - E ele abraçou-me, como quem abraça um/a irmão/ã, um/a amigo/a. Eu fiquei perplexa mas comecei-me a rir.
A minha natureza é essa, começar-me a rir quando não sei que mais fazer. E ele afirmou que eu era uma óptima pessoa e disse que o que tínhamos nunca ia ter com ninguém. (Sim continuo a falar de um desconhecido que nunca tinha visto na vida.) Senti-me lisonjeada com tal afirmação e ao mesmo tempo atónita com o que estava a ouvir.
E abraçamo-nos novamente, uma união de almas a despedir-se.
- Prazer em conhecer e até breve.
- Até breve.
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Sinto que aprendi muito, aprendi que existem pessoas realmente únicas neste mundo. Aprendi a nunca desistir de encontrar esse tipo de pessoas, que podem não ser iguais a nós mas são, imensamente, parecidas. (Pelo menos no que importa, cá dentro no coração)
Nunca esquecerei a conversa que tive com aquele Senhor. Assim como sei que ele nunca me esquecerá a mim. (Basta lembrar-me dos momentos em que quase vi lágrimas nos seus olhos.)
Nesses momentos, até eu ficava emocionada.
Foi um privilégio Senhor Mário, a sério que sim. Obrigada por me ter relembrado o que é um ser humano de verdade.
Hoje em dia é tão complicado achar um.
4 comments:
Nobody realizes that some people expend tremendous energy merely to be normal.
Albert Camus (1913 - 1960)
You Know Who (=
belo texto, belo livro tambem:P
É de pessoas como o Senhor Mário que o mundo precisa... Mas infelizmente estão escassas, mas felizmente ainda existem! ;)
Those who dream by day are cognizant of many things which escape those who dream only by night.
Edgar Allan Poe
Anonymous
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